“DESAPOSENTAÇÃO”: RENÚNCIA A BENEFÍCIO ORIGINÁRIO EM PROL DE NOVA APOSENTADORIA, PECUNIARIAMENTE MAIS BENÉFICA. INADMISSIBILIDADE.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0012116-85.2010.4.03.6105/SP
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à remessa oficial tida por interposta e à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | PAULO GUSTAVO GUEDES FONTES:67 |
Nº de Série do Certificado: | 3DDA401E3F58F0FE |
Data e Hora: | 15/01/2013 16:17:36 |
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Paulo Fontes: Cuida-se de apelação interposta pelo INSS, em face de sentença prolatada em autos de demanda previdenciária ajuizada com o objetivo de ver reconhecido o direito à “desaposentação“, consistente na substituição da aposentadoria percebida pela parte autora, por outra mais vantajosa, com o cômputo de contribuições previdenciárias correspondentes ao exercício laboral posterior ao primeiro afastamento, sem que se veja obrigada a proceder à restituição dos valores percebidos a título do benefício originário.
A r. sentença recorrida julgou procedente o pedido, para determinar à autarquia ré a promover a desaposentação pretendida, com o consequente cancelamento do benefício anteriormente concedido e implantar o novo benefício, a partir de 10/09/2010, bem assim a pagar as prestações vencidas, descontados os valores recebidos pelo benefício cancelado, desde o início da nova benesse, com correção monetária, juros moratórios e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o total da condenação, aplicada a Súmula 111 do C. STJ.
Inconformado, o INSS interpôs recurso de apelação, requerendo o reconhecimento da decadência e a reforma do julgado, ao fundamento de não se encontrar presente respaldo legal a amparar a pretensão da parte autora, aduzindo igualmente a constitucionalidade e imperatividade da vedação legal à utilização das novas contribuições vertidas após a aposentadoria originária à obtenção de novo benefício. Afirma que o art. 18, § 2º, da Lei nº 8.213/1991 prevê, expressamente, que o segurado aposentado que permanecer em atividade sujeita ao RGPS ou a ele retornar, não terá direito a qualquer prestação da Previdência Social em decorrência dessa atividade, exceto salário-família e reabilitação profissional, quando empregado.
Regularmente processados, subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Paulo Fontes: Aplicando a nova Súmula 490 do C. STJ e tendo em vista que a sentença proferida nestes autos é ilíquida, devendo o quantum debeatur ser apurado em fase de liquidação, inaplicável ao caso o disposto no §2º do art. 475 do Código de Processo Civil, que dispensa o reexame necessário na hipótese de a condenação, ou o direito controvertido, ser de valor certo e não exceder 60 (sessenta) salários mínimos (cf. STJ, Corte Especial, ERESP 934642, Rel. Min. Ari Pargendler, j. 30/06/2009, por maioria, DJE 26/11/2009; STJ, Corte Especial, RESP 1101727, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 04/11/2009, v.u.,DJE 03/12/2009).
Assim, tenho por interposta a remessa oficial.
Inaplicável, na espécie, o instituto da decadência estabelecido no art. 103 da Lei nº 8.3213/91, com a redação dada pelas Leis nºs. 9.528/97, 9.711/98 e 10.839/2004. Isso porque, conforme se observa de pronto, a pretensão posta a juízo ultrapassa a esfera da revisão do procedimento concessório do benefício ou da renda mensal inicial originariamente estabelecida. Trata-se de pedidos sucessivos de renúncia de benefício, com seu cancelamento e concomitante implantação de nova benesse, em tese mais vantajosa, computando-se, para tanto, contribuições previdenciárias anteriores e posteriores ao primeiro ato de aposentação.
Assim, mesmo que a pretensão do segurado seja a de majorar o valor da renda mensal por ele recebida, o fato gerador da majoração almejada consiste fundamentalmente nas contribuições vertidas após a aposentadoria, em virtude sua permanência ou retorno à atividade laborativa submetida ao Regime Geral da Previdência Social.
A questão da “desaposentação“, como vem sendo chamada, não implica, em verdade, em desfazimento ou renúncia à aposentadoria. O que se quer, para além da nomenclatura utilizada, é a majoração do benefício de aposentadoria já concedido, quando o aposentado permanece ou volta ao mercado de trabalho e passa a contribuir novamente com a Previdência Social.
Portanto, a verdadeira questão jurídica sub examine não versa sobre a possibilidade de renúncia à aposentadoria, nem mesmo sobre o ato jurídico perfeito em que consistiria a aposentadoria concedida.
Perquire-se, sim, se é lícito e constitucional que o trabalhador já aposentado, que volte ao mercado de trabalho, passe a contribuir para a Previdência Social sem que as contribuições posteriores à aposentadoria resultem em novas prestações em seu favor, além daquelas nominadas no art. 18, § 2º, da Lei 8.213/91, in verbis:
É sabido que, anteriormente, a Lei 8.213/91, nos seus arts. 81 a 85, previa o pecúlio, isto é, a devolução das contribuições pagas pelo trabalhador já aposentado que tivesse permanecido ou retornado ao mercado de trabalho. O pecúlio restou extinto em 1994 e a questão foi disciplinada pelo art. 18, § 2º, acima transcrito.
Inicialmente, entendo que, para se conceder o que se pede nas ações ditas de “desaposentação“, seria necessário declarar-se a inconstitucionalidade do já citado art. 18, § 2º, submetida à reserva de Plenário, uma vez que a questão não foi ainda decidida pelo Supremo Tribunal Federal.
Não me parece, com efeito, que haja outra interpretação para o artigo em questão, que não o de impedir quaisquer efeitos previdenciários para as novas contribuições, recolhidas, depois da aposentadoria, pelo beneficiário que permaneça ou volte ao mercado de trabalho. A lei é explícita em permitir apenas o salário-família e a reabilitação profissional, afastando, pois, o auxílio-doença e outros benefícios; decorre logicamente daí, da mesma forma, a vedação do aproveitamento das novas contribuições para a majoração dos valores do benefício concedido anteriormente.
Sob o prisma de sua constitucionalidade, tenho que a norma em questão não fere a Carta Magna e o seu alcance está no âmbito de discricionariedade do legislador. A amplitude das coberturas da Previdência Social no Brasil e o número de cidadãos atendidos por esse sistema, um dos maiores do mundo, exigem circunspecção nas despesas, sendo viável ao legislador limitar a concessão de novas prestações ao trabalhador que foi aposentado e cuja família já se acha assistida.
Observe-se que não se limita em nada a liberdade individual de permanecer trabalhando ou de voltar a trabalhar, afastando-se, contudo, a concessão de benefícios que decorreriam das novas contribuições pagas.
Temos, ainda, que a permanência dos aposentados no mercado de trabalho é fator que contribui para o desemprego, havendo também esse aspecto a respaldar a razoabilidade da escolha legislativa, ao não estimular tal prática, vedando-lhes a concessão de novos benefícios previdenciários.
Com efeito, cabe ao legislador definir os critérios de proteção previdenciária:
É clara, pois, a escolha política feita pelo legislador brasileiro, representada pelo fim do pecúlio em 1994 e pela dicção, constante acima, do art. 18, § 2º, da Lei 8.213/91.
A opção legislativa, realizada pelos Poderes que detêm a maior parcela da legitimidade propriamente política, resta evidente também quando se evoca o veto presidencial ao Projeto de Lei nº 7.154/2002, que alterava o art. 96 da lei 8.213/91 com o objetivo de permitir a renúncia à aposentadoria.
Dessa forma, qualquer alteração na sistemática atual, visando ao aproveitamento das contribuições posteriores à aposentação, deve partir dos Poderes Legislativo e Executivo. As medidas referentes à chamada desaposentação extrapolariam a função do Poder Judiciário, representando ofensa ao princípio da separação dos Poderes.
Por fim, o fato de o trabalhador, já aposentado, voltar a contribuir com o sistema, sem dele auferir novos benefícios, não pode ser considerado enriquecimento ilícito por parte da Previdência Social. A permanência ou o retorno ao mercado do trabalho é opção do aposentado. Por outro lado, o sistema é de filiação e contribuições obrigatórias e, apesar do seu caráter contributivo, as contribuições não implicam necessariamente em contraprestações, tendo em vista o caráter público da Previdência e os seus princípios inspiradores, como o da solidariedade.
O Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento da contribuição social dos servidores públicos inativos (ADI 3105/RS, Rel. Min. Cezar Peluso), ressaltou:
A mencionada decisão da Corte Suprema, órgão investido na função de intérprete maior da Constituição, ainda que referente ao regime próprio dos servidores, é suficiente para afastar a suposta vinculação de toda e qualquer contribuição previdenciária a uma contraprestação direta em favor do segurado, uma vez que os servidores públicos inativos continuam contribuindo, sem fazer jus a novos benefícios que não aqueles já usufruídos.
Seguindo esse entendimento, a E. Oitava Turma desta C. Corte vem se posicionando pela inviabilidade da “desaposentação” nos moldes perquiridos pela parte autora, tal como definido pelos arestos que, por serem esclarecedores, passo a transcrever:
Dessa forma, reafirmo a vedação legal da chamada desaposentação, bem como a compatibilidade da proibição com os princípios e regras constitucionais.
Ante o exposto, presentes as condições da ação e respeitado o princípio do devido processo legal, dou provimento à remessa oficial tida por interposta e à apelação do INSS, para reformar a r. sentença recorrida e julgar improcedente o pedido inicial.
Embora sucumbente, deixo de condenar a parte autora no pagamento de verba honorária, por ser ela beneficiária da justiça gratuita – artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição da República (REsp 27821-SP, REsp 17065-SP, REsp 35777-SP, REsp 75688-SP, RE 313348-RS).
Oficie-se ao INSS, comunicando-lhe o inteiro teor dessa decisão, para a adoção das providências administrativas cabíveis.
É o voto.
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | PAULO GUSTAVO GUEDES FONTES:67 |
Nº de Série do Certificado: | 3DDA401E3F58F0FE |
Data e Hora: | 15/01/2013 16:17:33 |
Deixe um comentário