É
possível a concessão de pensão por morte quando o instituidor, apesar de
titular de benefício assistencial, tinha direito adquirido a benefício
previdenciário não concedido pela Administração.
Essa
foi a tese firmado pela Turma Nacional de Uniformização (TNU) no julgamento do Tema
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Trata-se
de um pedido de uniformização (quando há divergência entre decisões das Turmas
Recursais na interpretação da lei)[1]
no qual discutia-se e a possibilidade de concessão de pensão por morte estando
a instituidora da pensão (segurada falecida) recebia benefício
assistencial (BPC/LOAS) por equívoco do Instituto Nacional do Seguro Social
(INSS).
O
questionamento jurídico no processo, era sobre a qualidade de segurada especial
da falecida, a fim de identificar se houve equívoco ou não por parte do INSS
quando da concessão do benefício assistencial ao invés de um benefício
previdenciário.
A
divergência foi apontada após decisão da Turma Recursal do Rio Grande do Sul, onde
incutiu a possibilidade de o juízo verificar a correção do ato de concessão do
benefício, ou seja, aferir se o benefício assistencial era de fato o devido ou
se foi equivocadamente aplicado no lugar de um benefício previdenciário.
Com
isso, nasceu a controvérsia para solução da seguinte tema: “se é possível
a concessão de pensão por morte quando o instituidor, apesar de titular de
benefício assistencial, tinha direito adquirido a benefício previdenciário”.
Na
sentença (primeira decisão) foi reconhecida a qualidade de segurada da
falecida, da qual transcrevo trecho a seguir:
“Da
análise dos documentos anexados aos autos e dos depoimentos colhidos em
audiência de instrução e julgamento, tem-se comprovado que a instituidora da
pensão possuía qualidade de segurado especial em regime de economia familiar.
O autor, seu esposo, é aposentado na condição de trabalhador rural. No ponto, é
mister salientar que a qualificação de lavrador atribuída ao cônjuge bem se
estende à esposa, tendo em vista a própria realidade do trabalho campesino,
conforme o teor da Súmula 06 da TNU.”
Ou
seja, extrai-se do trecho da sentença acima, o seguinte raciocínio. O autor da
ação, esposo da segurada falecida, é aposentado na condição de trabalhador rural.
Assim, é crível concluir que pela realidade do trabalho ela (falecida) também
era uma trabalhadora rural. Logo, ostentava a qualidade de segurada especial.
Contra
a sentença acima mencionada, o INSS interpôs recurso à Turma Recursal do Rio
Grande do Sul. Onde um dos julgadores (cujo voto vencido) argumentou que
a sentença que reconheceu o direito ao trabalhador, deveria ser mantida pelos
seus próprios fundamentos.
O
magistrado salientou que “Para que haja o reconhecimento da qualidade de
segurado especial, faz-se necessário que o início de prova material seja
corroborado por testemunhos idôneos.”
Igualmente, citou decisão do Superior Tribunal
de Justiça (STJ), em que reconhece a condição de segurada especial à esposa de trabalhador
rural quando se tem o início de prova material em nome do cônjuge, ainda que
falecido, for confirmada por testemunhos confiáveis.
Senão
vejamos, o trecho citado da jurisprudência do STJ:
“A
jurisprudência desta Corte reconhece a condição de segurada especial à esposa
de lavrador se o início de prova material em nome do cônjuge, ainda que
falecido, for corroborado por testemunhos idôneos, assim definidos pela
instância ordinária.”
(AgRg no AREsp 105.451/MG,
Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/03/2014, DJe
20/03/2014).
Registro
aqui, apenas para conhecimento, nesse caso julgado pelo STJ em 2014, foi
juntado no processo como prova documental, a certidão de casamento, na qual
constava a profissão de lavrador do autor da ação.
Com
base em documentos, ficou comprovado ainda, que a parte autora recebia aposentadoria
rural por idade desde 2008, e tudo isto foi confirmado por testemunhos idôneos,
consignado nos fundamentos da sentença guerreada.
Faço
esse registro, a fim de relembrá-los de que a percepção do magistrado, ao
colher o depoimento das testemunhas, ou seja, prova oral, deve ser prestigiada,
em homenagem ao princípio da oralidade, uma vez que teve contato direto com as
partes e suas testemunhas.
Retornando
ao caso em análise, o magistrado cujo voto foi vencedor disse o seguinte:
“Abro divergência
quanto à qualidade de segurada da instituidora. Conforme o CNIS, juntada em
audiência, o óbito ocorreu (2012) ao tempo em que a instituidora gozava de
benefício assistencial por deficiência (desde 1997). Dessa forma, não se
tratava de segurada ao tempo do óbito.”
O
voto cujo trecho acima foi extraído, prevaleceu no Acórdão e decidiu a questão.
A
esse respeito, o relator do caso na TNU, o juiz federal Atanair Nasser
Ribeiro Lopes, observou que o debate era difícil de se perceber sobre a revaloração
da prova já produzida e não para analisá-las novamente nem tão pouco para rediscuti-las.
Vejamos
nos exatos termos em que foi dito pelo relator:
“Antes de assentar
sobre o mérito, registro que o debate voltou-se para uma linha tênue de
revaloração da prova já produzida e não para o seu revolvimento e rediscussão.
Nessa perspectiva, volto aos termos do voto que prevaleceu e o comparo com a
sentença e o voto vencido, de modo a demonstrar que a discussão na turma de
origem não revolveu a prova produzida, mas a interpretou sob pontos de vistas
diferentes.”
O
voto que resultou vencedor, e, portanto, deu razão ao INSS, apoiou-se no raciocínio
de que a falecida recebia benefício assistencial em 1997, mas morreu em 2012, e
por essa razão não era uma segurada da previdência social quando faleceu.
Entretanto,
como bem, assevera o relator do caso na TNU, o douto magistrado da turma de
origem, “se esqueceu que tanto a sentença como o voto vencido interpretaram
que o benefício foi lá atrás deferido equivocadamente, muito embora não tenham
dito expressamente.”
Nessa
linha, o relator do julgado, registra que o destaque desses dois atos judiciais
é a “consideração de que a falecida, quando pleiteou o benefício no INSS,
tinha qualidade de segurada especial e lhe seria devido, a bem da verdade, um
auxílio-doença ou uma aposentadoria por invalidez, ao contrário do benefício
assistencial por deficiência lhe deferido.”
E registrar que essas “premissas foram
expressamente suscitadas em embargos de declaração interpostos pela parte, os
quais foram ignorados quando do seu julgamento.”
Isto fica cristalino, ao observarmos os
fragmentos colhidos dos atos judiciais citados:
Da
análise dos documentos anexados aos autos e dos depoimentos colhidos em
audiência de instrução e julgamento, tem-se comprovado que a instituidora da
pensão possuía qualidade de segurado especial em regime de economia familiar. O
autor, seu esposo, é aposentado na condição de trabalhador rural. No ponto, é
mister salientar que a qualificação de lavrador atribuída ao cônjuge bem se
estende à esposa, tendo em vista a própria realidade do trabalho campesino,
conforme o teor da Súmula 06 da TNU. (sentença)
[…]
4. Para
que haja o reconhecimento da qualidade de segurado especial, faz-se necessário
que o início de prova material seja corroborado por testemunhos idôneos. Neste
sentido é a jurisprudência do STJ: […] 5. No caso em exame, a prova
documental trazida aos autos (certidão de casamento, na qual consta a profissão
de lavrador do autor; INFBEN, que comprova que a parte autora recebe
aposentadoria rural por idade desde 2008), foi corroborada por testemunhos
idôneos, conforme consta dos fundamentos da sentença guerreada. A percepção do
douto magistrado, quanto à prova oral, deve ser prestigiada, em obséquio ao
princípio da oralidade, uma vez que teve contato direto com as partes e suas
testemunhas. (voto vencido)
Com
essas observações apontadas pelo relato do caso na TNU, verifica-se com clareza,
(atos judiciais) que em 1997 a falecida, ora instituidora da pensão possuía
sim, a qualidade de segurada especial. Mesmo assim, ao solicitar o seu benefício
ao INSS, recebeu benefício diverso daquele que que teria direito.
Esse
erro do INSS, só foi percebido quando do pedido de pensão por morte.
Basta
observarmos que o voto tido como vencedor, considerou o estado de segurada
apenas em 2012, quando do óbito, desprezando a situação da falecida quando solicitou
o benefício lá atrás em 1997.
Para
chegarmos a essa conclusão, basta observarmos que a atenção dos julgadores (voto
vencido e voto vencedor) foi divergente, pelo fato de que uns olharam para
1997 e outros para 2012.
Foi
por isso que os últimos julgadores corrigiram o erro do INSS no sentido de considerar
que lá em 1997 o correto seria a concessão de benefício previdenciário por
incapacidade, e não beneficio assistencial, sanando o equívoco do INSS no ato
de concessão, chegando à conclusão de que o autor faria jus à pensão por morte
em 2012.
A
questão, portanto, é saber se é possível investigar esse erro na concessão pela
Autarquia, ajustando-se corretamente o que deveria ter sido concedido ao
segurado.
Por
fim, após citar decisões anteriores, o relator do caso na TNU, registro novamente,
ATANAIR NASSER RIBEIRO LOPES, Juiz Federal, votou para definir a seguinte tese “é
possível a concessão de pensão por morte quando o instituidor, apesar de
titular de benefício assistencial, tinha direito adquirido a benefício
previdenciário não concedido pela Administração”.
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